Afastando-se alguns metros do tumulto no portão principal do forte, Mestre Aramil espalma os dedos dos pés descalços sobre o gramado úmido do sereno enquanto clama pela bênção do Oboé. Sua percepção de si desaparece automaticamente... Num instante, o sacerdote sente cada gota de sereno que despenca em direção ao solo, cada banco de neblina que espreita nas redondezas, cada esquilo, serpente e pássaro que cruza a região. Ele sabe onde estão cada uma das raízes de todos os fios de grama sob seus pés. Ele sente cada caule e tronco abaixo de si e segue a profunda e densa energia que pulsa do centro da terra rastejar subindo pelos seus calcanhares e pernas como a seiva de um carvalho, penetrando seu corpo, entranhas e coração, explodindo pelo topo da sua cabeça como uma fonte que jorra energia em direção à noite estrelada. É essa energia que está corrompida. É ela que está suja com algo que está agindo nas profundezas. Seus olhos esbranquecem por completo e em sua mente ele vê... Há uma vasta câmara subterrânea nas profundezas de uma masmorra próxima. No centro dela, há a escultura de um crânio recém despedaçado, seus escombros ainda espalhados pelo solo. Diante desse ídolo, há um grande fosso cujo fundo aprisiona uma multidão de mulheres e crianças humanas e meio-orcs se amontoando em desespero, pisoteando umas às outras entre dejetos, sangue e lágrimas. Da beirada, em torno do crânio de pedra, quatro sacerdotisas drow estralam chicotes e açoites sobre as faces das vítimas feridas dentro do fosso, gargalhando e exibindo suas peles negras seminuas, em trajes feitos com fios de prata que lembram as teias de uma aranha. Sob duro açoitamento, algumas das mulheres e crianças vão desistindo de suas vidas. Suas almas são rapidamente sugadas, capturadas pelo símbolo sagrado em forma de aranha que uma quinta sacerdotisa sustenta na beirada oposta do fosso, gesticulando e entoando magias profanas que contaminaram a percepção de Aramil na superfície... Fora do fosso, atrás da sacerdotisa feiticeira, há uma jaula com toda uma família prisioneira, mulher e três filhos pequenos, um deles ainda pequeno, no colo de uma das irmãs. Fora dessa jaula, três outras sacerdotisas açoitam as crianças. Uma delas usa um chicote para prender os braços da mulher adulta às grades obrigando-a assistir um espetáculo obsceno: diante da jaula, o crepitar de uma chama violeta revela um humano deitado e nu sobre uma laje escura. Aramil reconhece o Mestre Sigred. Ele sustenta outra belíssima humanóide nua sentada sobre seu ventre, uma ruiva desconhecida. Pela aura antinatural, dessa mulher, Aramil sente que ela certamente não é humana, elfa ou drow. Nem mesmo à Oërth ela pertence e talvez nem esteja viva, pois não existe alma dentro do seu corpo. A ruiva entrelaça suas pernas, braços e língua com Sigred que, paralisado, jaz catatônico, tremendo como se estivesse em convulsão. Dentro da jaula, a esposa grita e chora desesperada, a irmã mais velha tenta cobrir os olhos das demais crianças. A ruiva gargalha em êxtase, usando sua boca e seu ventre para rebolar sobre Sigred enquanto geme e entoa um hino num idioma irreconhecível. Seus quadris pulsam contaminando a energia que atingiu os sentidos de Aramil na superfície. O vazio da alma da ruiva é tão grande que drena a energia vital do corpo de Sigred com muita rapidez. O corpo forte do capitão da guarda mingua como se estivesse adoecendo, envelhecendo dez anos em alguns poucos instantes. Aramil abre os olhos com a sua energia divina totalmente restabelecida e com certeza que sabe traçar o caminho pela masmorra até a câmara onde está acontecendo esse ritual macabro. Esse caminho começa nos aposentos da Condessa e de lá, segue rumo às profundezas por cerca de uma milha.