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Capítulo 3 – A Viagem para o Terceiro Mundo

Na manhã do dia seguinte, a cidade de Akayu parecia um formigueiro. Dezenas de pessoas se moviam em direção ao estaleiro, indo e levando mercadorias e materiais para o Cisne Dourado. O belo barco brilhante da Capitã Carmelitta era um galeão gigantesco, com acomodações de luxo e dezenas de canhões, em pelo menos três pisos. Golens faziam parte de sua tripulação: há muito se especulava a origem de seus marujos, seres mágicos de pedra branca, além de cerca de uma dúzia de humanos, entre homens e mulheres, que desempenhavam as mais diversas funções: de cozinheiro à timoneira.
Os expedicionários se despediram da Corte Real yudana no porto próximo à Pagoda das Almas. O Rei Khâr havia dado conselhos e abraços em todos quando da despedida. Fez um discurso na praça do porto, e o grupo partiu regado por aplausos e ovações. Lorde Sebastian Barka comandava o caminho. Liandre, Kataranagi, Carwin e o pequeno Pirralho iriam com ele. Suas bolsas cheias de mantimentos, seus bolsos cheios de dinheiro. Armaduras polidas, armas afiadas. Era início da tarde quando zarparam de Akayu.
De lá rumaram ao sudeste, pela parte oriental do Mar do Lótus de Jade. O “Cisne Dourado” navegou próximo à costa, até a fronteira com o Segundo Mundo, região em que o Reino Magno fazia fronteira com o Grão Reino de Rivolid. Cada mundo era como uma porção de continentes: no Primeiro Mundo estava o Reino Magno. No Segundo Mundo, Rivolid e Temperance. No Terceiro Mundo, o Litoral Andoriano, para onde iriam. A Capitã Carmelitta foi uma das únicas, na história de toda a Kereato, a percorrer dez dos Dezesseis Mundos.
- Bom dia marujos!!! Quero lhes apresentar nossos digníssimos passageiros – disse a Capitã Carmellita para a tripulação. Individualmente apresentados, ela continuou – Nós vamos navegar para o Porto Croft, na costa de Temperance. Eles irão selar a Cavaleira Descartia.
Um silêncio desconfortável foi interrompido apenas pelo som dos pássaros e das ondas.
- Pois é, sei que parece mentira. Mas é isso. Não admitirei covardia no meu convés. Se essa é a decisão deles, tudo o que podemos fazer é apoiá-los. Coragem, com a graça de Férkan! – disse a capitã, erguendo sua espada de marfim no ar e convocando um brado de seus tripulantes. Ela foi seguida por seus golens, que urraram em tom de apoio.
Logo em seguida, a agitação tomou o convés inferior e logo as velas, cordas e caixas eram movidas para todo lado. A viagem seguiu tranquila, e os passageiros permaneceram no convés, olhando para o norte, em direção à costa. Viram as grandes montanhas fronteiriças entre o Primeiro Mundo e o Segundo Mundo, e curiosos, voltaram-se para o nordeste.
Na manhã seguinte mantiveram o curso indo para o leste. O dia estava com um céu muito azulado e sem nuvens, embora o vento soprasse forte. Avistaram vários barcos mercantes na costa do Porto Julieta, e no entardecer, deixaram de vez as águas do Mar do Lótus de Jade para entrar no temível Oceano Perigotto, cheio de trucídias, baleias voadoras e dragões do mar. Quando anoiteceu, o céu encheu-se de estrelas, que no meio do mar, pareciam brilhar ainda mais juntamente ao reflexo das ondas.
Durante o jantar, Pirralho cantou para todos no convés. Cantigas alegres e histórias simples cativaram até mesmo os golens, que acabaram por dançar e entoar cantos de sua ilha natal. Certo tempo depois, quando a agitação diminui e os marujos descansavam, histórias começaram a ser contadas por aqueles que permaneceram acordados. Primeiro contos leves, como o dia em que um golem Kabaco beijou uma sereia, ou quando Mato e Huba avistaram o Vento do Leste dançando entre nuvens. Então vieram os contos de romance, e em seguida, as histórias macabras.
Pirralho estimulava os insones a compartilhar seus contos de terror, até que chegara a vez de Lorde Sebastian, que até então se mantinha observador e calado próximo ao mastro principal.
- Lorde Sebastian, nosso mecenas!!! Agora é sua vez de contar-nos uma história de terror... deleite nossos ouvidos com as histórias da corte Khortiana! – exclamou o duende bardo.
- Quero falar e ouvir sobre a Cavaleira Descartia. – todos emudeceram pela sobriedade das palavras do nobre – O que vocês já ouviram sobre ela?
- Dizem que ela destruiu um cidade inteira em Temperance. Uma general apaixonada invocou-a, mas o povo foi capaz de parar a catástrofe com uma caixinha de música. – relatou a timoneira.
- Ouvi dizer que ela dizimou um exército inteiro nas areias do deserto de Khort – comentou o monge Kataranagi – Eles iam atacar a Fortaleza da Esperança Ardente, e no meio do caminho, acabaram invocando a Cavaleira. Então as areias se abriram e eles foram engolidos. Desaparecidos para sempre.
- Sei de um boato que fala que ela destruiu o Reino de Androsphera sozinha, do dia para a noite. – disse o golem Hunde – Ela apareceu e destruiu tudo na região, que agora é uma floresta.
- Ela também atacou as Fazendas La Villaça, perto da Costa Dourada. – disse Liandre.
- Ouvi que ela aparece quando alguém chora desejando um desastre, come a pessoa e faz uma tragédia acontecer! – disse o grumete.
- Não, isso não é bem verdade. É um coração apaixonado, um coração apaixonado que foi rejeitado. Aí ela aparece e destrói o lugar para procurar a pessoa. - corrigiu Liandre.
- Ouvi dizer que ela é a mãe de todos os Cavaleiros das Trevas, e que eles têm medo dela. Quando ela aparece, até mesmo eles fogem. – disse Carwin.
- Isso tudo é mentira. A Cavaleira Descartia é uma lenda, que não existe. Ela foi criada pelos humanos para explicar os desastres que eles causaram e tinham vergonha de admitir... – esbravejou o golem Huba.
Uma discussão agitada começou entre os marujos, que foi interrompida pela voz da Capitã de Laquilla, saindo da cabine de comando. Ela trajava roupas mais leves, pois se preparava para dormir. Veio caminhando e falando, em direção ao grupo:
- A Cavaleira Descartia existe sim meus amigos. Eu já vi as consequências de suas ações em mais uma ocasião. Ela é temida porque seu poder é inevitável: quando a canção começa, nada pode pará-la.
- Obrigado Capitã – disse Sebastian. – De fato, tudo o que vocês disseram, tem um pouco de verdade, e um pouco de boato. Sim, ela destruiu desde cidades até reinos inteiros, e também um exército em Khort, mas isso aconteceu há milênios. O fato é, não existe um período certo, mas em determinadas épocas, ela aparece através de pessoas que estão tristes por causa do amor. Pode ser um amor romântico, um amor familiar, ou uma lembrança amorosa muito negativa. Tem que ser algo que traga culpa, dor, vontade de desaparecer, desespero. É por isso que nenhum reino está a salvo, nem monarca nem plebeu: todos podemos nos desesperar um dia. – explicou o nobre.
Todos se acomodaram para continuar lhe ouvindo, a capitã estava ao seu lado, em pé, atenta às suas palavras.
- Sabe-se que as últimas aparições dela foram em reinos muito distantes. Em Oblivice ela se aproveitou da Rainha Lunely Coldberg para impedir o casamento do príncipe e de uma plebeia. A moça, que cultivou esperanças quando foi pedida em casamento, entrou em desespero ao saber que o príncipe foi impedido de casar com ela. Acabou possuída pela Cavaleira Descartia, que usou seu corpo para se invocar no local. Quando sua canção terminou, o Reino de Oblivice foi soterrado por uma avalanche gigantesca. Boa parte do exército foi dizimada, incluindo o Rei, o príncipe e metade da cidadela. Apenas a rainha ficou viva dentre os nobres. Olívia Lunely Coldberg, a Rainha de Oblivice, enlouqueceu e se tornou uma tirana. Ela tem ódio de estrangeiros, e especialmente, das pessoas que a lembram da morte seu filho. – Contou Sebastian.
- Os detalhes de sua descrição impressionam – ironizou Carmelitta.
- Pobre povo de Oblivice, os sobreviventes provavelmente ficaram traumatizados - comentou Liandre.
- A Rainha enlouqueceu pouco depois. Usou todo seu poder para aprender arcanismo de gelo. É uma história trágica de uma rainha enlouquecida. – respondeu Sebastian.
- Essa cavaleira parece especialmente cruel – disse o grumete, com o olhar em devaneio, olhando para o céu estrelado.
- Todos os Cavaleiros são amaldiçoados, mas não quer dizer que sejam necessariamente cruéis. Ela deve ter sofrido algo muito terrível para ser tornar o símbolo literal das catástrofes. – disse Liandre, que olhava para o mar.
- Sim, mas não se pode ter pena deles. Eles não vão ter pena de nós. – após uma pausa de silêncio, a Capitã continou. – Agora vão dormir. Quem fica de vigia permanece, os outros, vão para cama. E torçam para que não sonhem com estas histórias bobas dos golens e do Pirralho.
A viagem pelo Mar das Baleias durou cerca de cinco dias. A Capitã comentou que aquela região era cenário de muitas batalhas entre as esquadras dos Reinos de Rivolid e Temperance, uma guerra que já durava quase um milênio. O “Cisne Dourado” chegou a ser perseguido por uma embarcação Rivolidiana, no quarto dia, mas o barco de Carmelitta era muito mais rápido e oferecia mais perigo aos perseguidores, que os deixaram em paz após algumas horas.
Depois de atravessar o Arquipélago da Névoa Dracônica, o “Cisne Dourado” chegou à região do Mar Estrelado. Kataranagi tentava ensinar a Pirralho como conter seus impulsos usando a meditação, mas o pequeno e ansioso duende parecia ficar cada vez mais impaciente conforme os dias a bordo passavam. Liandre e Carmelitta conversavam muito sobre o mar e as sereias, bem como criaturas marinhas, e seres místicos que uma relatava para a outra. Dias depois avistaram terra ao norte: o porto La Villaça, terra de mercados, circos e jogatina. O barco reabasteceu-se de suprimentos e água pura, e depois continuou navegando para o leste, em direção ao litoral de Temperance.
Cerca de dez dias depois de ter saído de Akayu, os navegantes chegavam ao Porto Crof na Costa de Temperance, que servia de entrada para o Segundo e o Terceiro Mundo. Sebastian, Liandre, Kataranagi, Carwin e Pirralho pegaram suas bagagens e desembarcaram no píer de madeira, próximo a uma grande fazenda. Enquanto o embarque e desembarque de mercadorias era feito pelos golens, os passageiros e a capitã foram até o prédio da guarda costeira.
Em um balcão, três guardas lhes recepcionaram:
- Sejam bem-vindos às Fazendas Croft. Quem são vocês e quais assuntos vieram tratar?
- Viemos para falar diretamente o senhor Joshua Croft, por favor. Sou a Capitã Carmelitta de Laquilla, do Cisne Dourado, e estes são meus passageiros. – ela apontou para o grupo. – É um assunto de extrema delicadeza.
- Pois bem. Phener, chame o sr. Croft na Mansão. – disse o soldado aparentemente mais importante, cuja armadura reluzia um brilho azulado. Enquanto isso, a capitã comentou com os aventureiros:
- Depois daqui vou para Portgard, mais ao sudeste, e então para o Porto de Delear. Volto para busca-los em alguns dias, e fico aqui até vocês voltarem. Mandem notícias quando puderem. Se não voltarem em duas dezenas, terei de partir. – explicou a Carmelitta.
- Entendemos senhorita. Não devemos deixar uma pirata presa em terra, é o que dizem. – disse Carwin.
- Obrigado por tudo Carmelitta. Estar em seu barco é desfrutar da melhor hospedagem dos mares. Sentiremos sua falta. – disse Sebastian, dando um abraço na capitã, afetuosamente correspondido.
Algum tempo depois, cascos de cavalo apressados se ouviram fora da instalação. Um homem de barba e uma longa capa marrom, com vestes bem costuradas e cores fortes entrou no lugar. Seu rosto tinha traços fortes e algumas cicatrizes, mas apesar da aparência de guerreiro, ele sorriu e correu para cumprimentar Sebastian e Carmelitta quando os viu. A mesma animação do encontro de Sebastian e a capitã agora foi revista quando estes dois se reencontraram com Joshua Croft. Alguns minutos de conversa depois, foi hora da despedida.
- Peço que não morram... se perceberem que as coisas não vão bem, não tem problema recuar e repensar a estratégia... se cuidem okay? – falou a mulher, e iniciou um processo de despedida, abraçando e cumprimentando cada membro do grupo, distribuindo conselhos simpáticos e desejando-lhes boa sorte. - Deixo este grupo de aventureiros em suas mãos Joshua. Cuide bem deles. Até logo todos, nos vemos em breve!!! – disse Carmelitta, saindo do local e voltando para o “Cisne Dourado”.
Depois da despedida, o grupo se virou para o homem, que lhes sorriu.
- Muito prazer, sou Joshua Croft, senhor dessas terras, e antigo Arqueiro do Reino de Yudá.

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